CryptoRave 2025

Extrativismo de dados, mais-valor comportamental e mercado de dados: por que ignoramos a produção das TICs?
17/05/2025 , Sala de Exposições
Idioma: Português brasileiro

Pretendemos analisar algumas das principais posições encontradas na literatura crítica sobre as tecnologias da informação e da comunicação, identificando que as noções de extrativismo de dados, de Morozov (2018), de mais-valor comportamental, de Zuboff (2021), e de mercado de dados, proposta por Amadeu (2019), partilham de um pressuposto, por vezes implícito: a neutralidade da tecnologia, a ideia de que os efeitos benéficos ou maléficos de uma tecnologia são frutos de seu uso. Segundo nossa interpretação, esse pressuposto seria índice de como esses autores priorizam de saída uma solução política para os efeitos maléficos das TICs – o tecnoutopianismo realista em Morozov, a mobilização democrática em Zuboff e a soberania digital em Amadeu –, o que interdita uma análise crítica e sistemática das TICS como aquela realizada por Julian Assange (2013), que prioriza a análise da infraestrutura de produção das TICs.


Apresentaremos, entre 25 e 30 minutos, uma breve recensão de parte da bibliografia crítica mais relevante sobre as tecnologias da informação e comunicação nos últimos dez anos, a saber, as reflexões do economista bielorusso naturalizado italiano Evgeny Morozov, da pesquisadora norteamericana Shoshana Zuboff e do cientista político brasileiro Sérgio Amadeu da Silveira. A escolha desses três autores se deve ao fato de sua influência nos discursos políticos progressistas nos últimos tempos: Morozov vem se tornando uma referência internacional na crítica ao discurso do Vale do Silício, fazendo palestras ao redor do mundo; A era do capitalismo de vigilância de Zuboff é um best-seller mundial; Sérgio Amadeu da Silveira é a principal figura pública relacionada ao movimento do software livre no Brasil desde o início dos anos 2000, tendo sido presidente do Instituto Nacional de Tecnologia da Informação no primeiro governo Lula.
Pretendemos defender que, apesar de suas contribuições relevantes, sobretudo no que diz respeito à análise do processo de coleta massiva de dados pessoais e seus impactos sociais e políticos, esses autores desconsideram a estrutura material das TICs, fundamental para a compreensão da constituição desse fenômeno, de acordo com Julian Assange. Assim, se, por um lado, esses autores criticam a ideia de neutralidade atribuída pelo Vale do Silício a essas tecnologias, mostrando como as TICs reforçam hierarquias e desigualdades sociais e minam a política democrática; por outro lado, retomam, involuntariamente, como decorrência da análise do consumo, a ideia de neutralidade das TICs ao defenderem a possibilidade do uso alternativo dessas mesmas tecnologias em uma outra configuração política e social, índice de como o interesse por uma saída política pode prejudicar a própria análise do fenômeno: Morozov, na sua crítica do extrativismo de dados realizado, sobretudo, pelas empresas do Vale do Silício, e sua ideologia – o solucionismo tecnológico –, argumenta em favor de uma apropriação pública dos dados, o que ainda subestimaria os efeitos sociais e políticos da coleta e armazenamento de dados pelo Estado; Zuboff, na análise da extração do mais-valor comportamental (behavioral surplus) pelas empresas de tecnologia, subestimaria a extração de mais-valor no interior das fábricas de semicondutores (como elaborada por Marx em O capital); por fim, Amadeu, na reflexão sobre os algoritmos, o mercado de dados e o colonialismo digital, defende a soberania digital como uma solução, o que subestimaria a divisão internacional do trabalho e a tendência centralizadora de produção das TICs e, portanto, sua natureza antidemocrática.

Doutoranda, mestra (2024) e bacharela (2020) em Filosofia pelo Departamento de Filosofia da USP. Pesquisou, no mestrado, a crítica da ideologia de A ideologia alemã, de Marx e Engels, financiada pela FAPESP. No doutorado, dedica-se à pesquisa da relação entre a crítica da ideologia de A ideologia alemã e a crítica da economia política encontrada nas Teorias do mais-valor. Tem experiência em filosofia da tecnologia.

Doutorando, mestre (2024), bacharel (2019) e licenciado (2023) em Filosofia pela Universidade de São Paulo. Áreas de estudo: Marx, marxismo ocidental, filosofia da ciência, filosofia da técnica e da tecnologia, Jacques Ellul.